07/03/2020

LEMBRANÇA ALADA


Em alguma vida fui ave.

Guardo memória 
de paisagens espraiadas
e de escarpas em voo rasante.

E sinto em meus pés
o consolo de um pouso soberano
na mais alta copa da floresta.

Liga-me à terra
uma nuvem e seu desleixo de brancura.

Vivo a golpes 
com o coração de asa
e tombo como um relâmpago 
faminto de terra.

Guardo a pluma
que resta dentro do peito
como um homem guarda o seu nome
no travesseiro do tempo.

Em alguma ave fui vida.

Mia Couto 
de Poemas Escolhidos

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