04/04/2009


Foto de dklimke

QUANDO A LUA VIER TOCAR-ME O ROSTO

Esta noite morrerás.
Quando a lua vier tocar-me o rosto
terás partido do meu leito
e aquele que procurar a marca dos teus passos
encontra urtigas crescendo
por sobre o teu nome.
Esta noite morrerás.
Quando a lua vier tocar-me o rosto
terás partido do meu leito
e uma gota de sangue ressequido
é a marca dos teus passos.
No coração do tempo pulsa um maquinismo ínscio
e na casa do tempo a hora é adorno.
Quando a lua vier tocar-me o rosto a tua sombra extinta marca
o fim de um eclipse horário de uma partida iminente e o tempo
apaga a marca dos teus passos por sobre o meu nome.
Constante.
O mar é isso.
A lua vir tocar-me o rosto e encontrar urtigas crescendo
por sobre o teu nome.
O mar é tu morreste.
O mar é ser noite e vir a lua tocar-me o rosto quando tu
partiste e no meu leite crescem folhas sangue.
A velocidade do sangue é tu partiste.
A febre é uma pira incompreensível como a aparição
da lua e a opacidade do mar.
No meu leito a lua vai tocar-me o rosto e a tua ausência é
um prisma, um girassol em panóplia.
Agora a lua chega devagar e o mar é leito de tu teres
partido, uma infrutescência de eu procurar a marca dos
teus passos por sobre o meu rosto.
A noite é eu procurar a marca dos teus passos.
Esta noite a lua terá um halo de concêntricas florações de
gotas do teu sangue
e a irisada sombra do meu leito é o teu rosto iminente.
A lua é uma seta.
Tu partiste é o silêncio em forma de lança.
Esta noite vou erguer-me do meu leito e quando a lua vier
tocar-me o rosto
vou uivar como um lobo.
Vou clamar pelo teu sangue extinto.
Vou desejar a tua carne viva, os teus membros esparsos,
a tua língua solta.
O teu ventre, lua.
Vou gritar e enterrar as unhas nos teus olhos até que o mar
se abra e a lua
possa vir tocar-me o rosto.
Esta noite vou arrancar um cabelo e com a tua ausência
faço um pêndulo parainterrogar a lua por tu teres partido
e a marca dos teus passos ser a razão mágica de a lua poder
surgir de noite e urtigas crescerem no meu leito.
E se encontrar a marca dos teus passos vou crivar-lhe o
coração de alfinetes
para que tu partiste seja a razão mágica de tu poderes morrer-te.
Quando a lua vier em forma de lança vai trespassar um pássaro
para lhe ler nas entranhas a direcção tu partiste e a marca dos
teus passos consiste nos olhos abertos de um
pássaro esventrado.
Ah, mas o luar é uma pluma do meu leito e a lua é o colo
de tu morreste para poderes enfim tocar-me o rosto.

Ana Hatherly
In Sigma,1965

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