21/12/2009


by Willem Haenraets

CAVALO DOS SONHOS

Desnecessário,olhando-me nos espelhos,
com um gosto de semanas, de biógrafos,de papéis.
arranco do meu coração o capitão do inferno,
estabeleço cláusula indefinidamente tristes.

Vagueio dum ponto a outro, absorvo ilusões,
converso com os alfaiates nos seus ninhos:
eles, amiúde, com voz fatal e fria,
cantam, botando em fuga os malefícios.

Há um país extenso no céu
com os superticiosos tapetes do arco-íris,
e vegetações vesperais:
para lá me dirijo, não sem uma certa fadiga,
pisando uma terra removida de sepulcros um tanto frescos,
eu sonho entre essas plantas de legume confuso.

Passo entre documentos desfrutados, entre origens,
vestido como um ser original e abatido:
amo o mel cediço do respeito,
o doce catecismo entre cujas folhas
dormem violetas envelhecidas, esvaídas,
e as vassouras, comovedoras de auxílio:
na sua aparência há decerto pesar e certeza.
Destruo a rosa que sibila e a ansiedade raptora:
rompo extremos queridos e ainda mais,
aguardo o tempo uniforme, sem medida:
um sabor que tenho na alma me deprime.

Que dia sobreveio! Que espessa luz de leite,
compacta,digital, me favorece!
Ouvi i relincho do seu cavalo vermelho
e nu, sem ferraduras e radiante.
Atravesso com ele sobre as igrejas.
galopo pelos quartéis desertos de soldados
e um exército impuro me persegue.
Seus olhos de eucalipto roubam sombra,
seu corpo de sino galopa e golpeia.

Preciso dum relâmpago de fulgor persistente,
um parente festivo que assuma as minhas heranças.

Pablo Neruda
In Residência na Terra I

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