12/05/2013




Ninguém saberá da secura de nossos olhos
da dureza de nossa boca ninguém saberá
do fio das unhas da dor no dente
do sangue guardado no fundo da gaveta
 
ninguém adivinhará os jardins atrás do muro fechado
ninguém quebrará o ferro do portão
ninguém violentará o secreto
ninguém te tocará profundamente
ninguém te saberá
ninguém.
 
Por isso olhamos as nuvens
sentados ao vento que não sopra
enquanto os balanços rangem
os rádios cantam
e a rua intocável como um quadro
pintado por outro.
 
Por isso olhamos em volta
e o que se passa além de nossa (uma palavra ileg.))
não nos soluciona
(ninguém sabe
ninguém saberá).
 
O caule quebrado do girassol
o livro de Toynbee sobre os degraus
a caneta riscando o papel
as nuvens
a tarde
a rua
 
o medo.
 
20 de dezembro de 1975.
 
Caio Fernando de Abreu
In Poemas Nunca Publicados por Caio Fernando Abreu
tela David P. Hettinger
 

Nenhum comentário: