20/06/2014

PALAVRAS AO VENTO



Talvez tivesse morrido de tédio em pleno azul da tarde
se não fosse o vento
vir subitamente e dizer
o que disse às suas orelhas pendidas.
Que logo não estavam pendidas: altas, escutavam
o vento,
um vento de setembro com qualquer coisa
dos janeiros limpos pelas chuvas
que jamais cessam de cintilar
na memória.
E o vento falou, depois enovelou-se no capim e
dormiu.
Merecidamente, deve ter pensado o que escutara
e, escutando-o, sentira novo gosto pela vida.
Foi o que concluí, olhando disfarçadamente o velho
caçador
ergue-se e distanciar-se pelo campo verde,
soprado assim por um vento que todos nós
gostaríamos
de ouvir,
agora jovem perdigueiro
indo-se como, digamos, um barco branco
de orelhas pandas,
leve e cada vez mais longínquo,
até se desfazer azul na tarde
azul.

Ruy Espinheira Filho
In Estação Infinita e Outras Estações
arte Renoir       

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