11/01/2009
Foto de bocavermelha-l.b.
CÂNTICO
Admirável espírito celeste
que ao ingênuo sonho o ingênuo movimento
dás, como à água que arrepia o vento...
Em que eterno silêncio é que te ocultas,
em que estranha cidade não repousas,
face de lua, sopro de uma rosa?
Como a sombra remota que se apega
à sua própria imagem e em cinza escura
se deixa submergir;como a da cega
visão interior que transfigura
a solidão da morte e mais se apura
quanta mais seja a treva que a reveste;
como a emoção mais simples e mais rica,
doce emoção de campo repousado
onde o sonho ficou, e nada fica;
como o incêndio terrível que outro incêndio
sente irromper da noite e se converte
em ríspida atmosfera soluçante,
assim te vê quem busca ofegante
uma substância mais amargurada,
ó grande estrela, ó luz desesperada,
ó torturante mito impassível
para os que desconhecem que ainda existe
tua presença neste mundo triste;
ó negra cordilheira inacessível,
ó caminho da alma, eterno oeste
onde dorme uma infância inatingida!
Que em teu recolhimento se projete
o sonho, e tudo para sempre esqueça,
e seja a imagem vã que a água reflete
e como a água humilde adormeça,
vivendo a noite, advinhando o dia,
admirável espírito celeste.
Alphonsus de Guimaraens Filho
In Água do Tempo
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