14/03/2009

CRISTAL




O tempo de viver tem seu cristal intato,
limpo de toda névoa e de tudo o que é forma
mesmo precária e vã de existir e sonhar.

Que relógio de sol lhe marca a intensidade,
o íntimo conviver da contínua linguagem?

Que dia se abrirá como dourada lâmina
no obscuro girassol do amor nas madrugadas?

Mesmo que tudo apague ou dilua no pranto
a presença da morte, e a noite só convoque
a seu largo silêncio inadiável, como
gritar, gritar que há sempre um outro renascer,
uma esperança além nos desígnios da vida?

Que sombra permanece a não ser esta angústia,
esta intranquilidade em que as coisas se deixam
conduzir, como um rio à procura de um mar?

Que sonho restará senão o desespero
de riscar com carvão este breve cristal?

Gilberto M. Teles
In Poemas Reunidos
tela de Claude Monet

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