16/08/2010

O PAGAMENTO





















De nossa vida inteira
ninguém saberá nada
nem mesmo do momento
em que desci a escada
para ver se chegavas
como uma lua branca
em plena madrugada.

Foi  num ninho de sílabas
que recolhi o espólio
de nossa travessia
como a luz de um farol
armazena os navios
que passam no horizonte
na quebra da alvorada.

Tudo em nós são mistérios
de sonhos e mormaços
colididos na sombra.
Meus lábios sigilosos
jamais mencionaram
uma camélia branca
que floresceu na tarde.

De silencios guardados
se tece a nossa vida:
areia acumulada
e em duna transformada
pelo vento que sopra
na beira do oceano.

Ao te amar eu me oculto
dentro de tuas pálpebras
como a réstia de luz
sob a porta fechada.
Respiro a tua forma
 como a água penetrada
entre as gretas da gruta.

Até o meu desejo
se faz esconderijo
dos dias miseráveis
do oceano ferido
da furna gotejante
da urna não guardada
do branco lençol sujo.

Somos seres contábeis
que dividem despesas
num balcão de segredos.
Quem perdeu? Quem ganhou?
E só não dividimos
a dor impartilhável
que está além do amor.

Lêdo  Ivo
In Crepúsculo Civil
tela by Jo Crowther

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