01/12/2010
AS ARTÉRIAS DO JARDIM
A natureza fez a videira
e a circunscrição vulcânica do vinho.
A vaidade: o espelho.
E no calendário velho de marcar o tempo
na parede,
a jovem deitada segurando frutos e flores
no silêncio de Toulouse-Lautrec,
fascinava.
Fascinava o corpo mais nú que a própria
nudez - totalmente indefeso -
de um Modigliani.
Fascinavam-me sim,
esses grandes cativos incapazes de dormir
mas interminavelmente ocupados em sonhar.
Estendida ante o milagre das formas,
os rumores do interior desconhecido
e sem romper o equilíbrio
que constitui a beleza,
amei a masturbação silenciosa
no dorso das criaturas veladas.
Amei o acrobata do circo iluminado,
o mascate das roupas íntimas,
o agrimensor em, seu tripé
de medidas e espaços infinitos.
Amei o sapateiro,
fêmeas bárbaras
e tantas cortesãs indulgentes
na desvassidão da Boate Tabú.
Eu amei um dandi.
E nas tiras das sandálias de Ícaro,
quando o tempo imprimia às descobertas
uma transparência
um teorema,
como um culto à serenidade e à exaltação
dos objetos amados.
Chorei - numa doçura perturbadora -
a Leda trêmula sob os passos e a morte
do cisne.
Ah meu jardim de juventude
e velho,
de artérias largas e profundas!
Meu jardim de infinitudes, ideogramas
e imagens - ressonante até as raízes -
estranhamente lúdico!
As ruminações se metamorfoseiam
como anéis de fumaça nos aquedutos da memória.
Eulália Maria Radtke
In Lavra Lírica
tela de Amedeo Modigliani
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