05/02/2013

REFLEXÃO



Divino e eterno é o Espírito.
A ele, de que somos imagem e instrumento,
leva o Caminho: nosso mais profundo anelo
é tornarmo-nos ele, em sua luz brilharmos.
Porém, terrestres e mortais que somos,
sobre nós - as criaturas - inerte cai o peso.
Em verdade propícia e maternal a Natureza cálida
cuida de nós, aleita-nos a terra, prepara-nos o
berço e a sepultura...

mas não nos apazígua
- paternalmente vara-lhe o materno encanto
a imorredoura centelha do Espírito:
paternalmente faz do filho um homem,
apaga a inocência e nos acorda para a luta e a consciência.

Assim entre mãe e pai,
assim entre corpo e Espírito,
vacila o filho mais frágil da Criação
- homem de alma tremente, afeito ao sofrimento
qual nenhum outro ser, e afeito ao mais sublime:
o mais crédulo e esperançoso amor.

Dureza é seu caminho, pecado e morte o seu alimento;
muitas vezes vagueia pela treva, muitas vezes seria para ele
melhor não ter sido criado nunca.
Mas eterno sobre ele fulgura o seu anelo,
seu propósito: a luz, o Espírito.
E sentimos que a ele, ao desgraçado,
ama o Eterno com especial amor.

Por isso, a nós, erradios irmãos,
cabe, talvez mesmo na desavença, o amor;
não julgamento e ódio,
mas paciente amor.
A aceitação amorosa nos leva
mais perto do sagrado objetivo.

Hermann Hesse
In Andares - Antologia  Poética
Tradução de Geir Campos
tela Dante Gabriel Rossetti

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